Políticas Públicas - Construção, Fortalecimento e Integração, livro de Luiz Roberto Alves, Anderson Rafael Nascimento (Orgs.)

Políticas Públicas - Construção, Fortalecimento e Integração

O trabalho universitário em favor de políticas públicas dos governos democráticos possui, hoje, características identificadoras, embora no interior de significativas diversidades: trata-se de botar o dedo nas urgências, fundamentar o discurso pelo laço prático-teórico e encarar as mediações. Explicando. O sentimento de crise econômico-financeira tem história na consciência das pessoas que estudam processos e métodos de governança. Haja vista o debate incessante (e as decisões dramáticas para as populações) sobre as reestruturações produtivas, os contingenciamentos governamentais, os... [Leia mais]
Descrição
O trabalho universitário em favor de políticas públicas dos governos democráticos possui, hoje, características identificadoras, embora no interior de significativas diversidades: trata-se de botar o dedo nas urgências, fundamentar o discurso pelo laço prático-teórico e encarar as mediações. Explicando. O sentimento de crise econômico-financeira tem história na consciência das pessoas que estudam processos e métodos de governança. Haja vista o debate incessante (e as decisões dramáticas para as populações) sobre as reestruturações produtivas, os contingenciamentos governamentais, os superávits, as dívidas pagáveis e impagáveis que povoam o cenário comum dos que pensam as coisas públicas desde o final dos anos 1980. Deste modo, quem estuda vai ao cerne dos problemas e vê que o lugar para compreender radicalmente o valor da ação pública é aquele da necessidade, no qual um misto de ausência de política e de não-compromisso governamental leva à anomia social, ao empobrecimento das gentes, à ilegalidade do sistema de vida. Conhecemos bem a criação de “estados paralelos” em cidades brasileiras. Tratar dos processos candentes e dos lugares de urgência é um ato científico e político que perfaz os sentidos da necessidade associados à compreensão mais eficaz dos fenômenos quando vistos em espectro mais amplo. Em segundo lugar, o trabalho científico evidencia que um lugar estabelece relações fenomenológicas com outros lugares e as obras que buscam compreendê-los fazem teoria precisamente na busca de seus sentidos mais entranhados. O estudo das mudanças socioclimáticas do território e dos modos de realização dos planos diretores, para começar com dois exemplos, leva à discussão, de um lado, sobre o destino humano na Terra (visto pelo ângulo do destino de grupos selecionados de comunidades) e, de outro, sobre as possibilidades que têm os municípios de ainda decidir autonomamente sobre seu território. Temas mundiais, decisivos para a vida social e para a continuidade da democracia. Botar o dedo nas urgências implica estar a discutir sobre o desencantamento e/ou o reencantamento do mundo. Teoria e prática, juntas. O terceiro ponto é que o trabalho científico encara as mediações na vida pública. O velho e bom tema sociológico, que se organiza sob novos sentidos na contemporaneidade, especialmente por vias das novas tecnologias de comunicação, significa que um conjunto de instituições pode facilitar ou dificultar a construção de políticas de governo em vista do bemcomum. Cidadãos e governos não estão ligados diretamente. Entre eles há culturas comunitárias, interesses econômicos, tradição política local/regional, o que demanda lucidez analítica, crítica dos fenômenos empíricos e ligações teóricas, a fim de explicar adequadamente o que acontece na relação entre a cidadania e o poder local. Em suma: para que se concretizem políticas públicas (preferivelmente integradas e amplas) é necessário compreender a mediação social e estimular o Estado a não perder-se nas mediações e avançar em suas finalidades políticas.

Daí que os textos desta obra, organizados a partir da Cátedra Prefeito Celso Daniel de Gestão de Cidades, da Faculdade de Administração e Economia da Metodista, recobrem os três pontos levantados e se fazem leitura útil e produtiva para lideranças públicas locais/regionais. Sua ordenação inicial os localiza tematicamente em três eixos, visíveis na ordem de leitura aqui apresentada, a saber: 1. Cultura e participação social como elementos inte-gradores (oito artigos); 2. Atenção a segmentos sociais vulneráveis e integração das políticas (cinco artigos) e 3. Arranjo informacional e governabilidade para a integração (cinco artigos).

Neles se apresentam estudos de território, com destaque para a reflexão européia da Profa. Sandra Caeiro, da Universidade Aberta de Lisboa. Ali aprendemos que não há caminho mais promissor, hoje, do que trabalhar as políticas de desenvolvimento urbano a partir de estratégias holísticas (que chamamos de integradas) e ações coordenadas por parte de toda a comunidade e suas instituições. Tão importante quanto, surge a discussão do Plano Nacional de Recursos Hídricos, realizada por Júlia Santos Silva, Daniel José da Silva e Janaina Sant’ana Maia Santos, da Universidade Federal de Santa Catarina. Ao tratarem do tema que envolve a humanidade, os pesquisadores lembram que tratados assinados pelas nações exigem transparência, responsabilidade, eficiência e participação no tratamento do grave problema da água. Tais valores podem, sem dúvida, ser postos na base da construção de todas as políticas.

Na sequência, se fosse possível agrupar por áreas os textos abertos à nossa leitura, teríamos a busca de intervenções planificadas, que compreende planos diretores, a ação das organizações sociais e planos de recursos, o plano nacional de recursos hídricos. As pesquisadoras Monica Hass, Myriam Aldana, Rosana Badalotti e Jamile Prezzi, da Universidade Comunitária Regional de Chapecó (SC) mostram as mediações problemáticas e os esforços comunitários para a construção do Plano Diretor da cidade. Como se sabe, a primeira conquista de um projeto como esse é a da legitimidade social, por vezes posta em disputa simbólica árdua. A memória do ciclo representado pelas organizações sociais na experiência de alguns governos paulistas, especialmente Mário Covas, é tratada aqui por Vera Schmidt. Envolvida no jogo político do Estado, a experiência merece leitura política que a qualifique e permita comparação com outras experiências. Um bloco de políticas participativas abre caminho na reflexão dos pesquisadores: a experiência rural do Pronaf no Paraná, sob metodologia de pesquisa-ação (Guilhermo Alfredo Johnson, Flávio Ramos e Maria Cristina Crestani, da Universidade do Vale do Itajaí), o hip hop em Diadema, fenômeno das identidades em movimento (Fátima Vaz e Marília Godoy, das Universidades São Marcos e PUC) e o debate inadiável do emprego e da renda, processo ocorrido em Santo André (Jerônimo Almeida Neto e Sandro Renato Maskio). Os pesquisadores e as pesquisadoras enfrentam as mediações da economia e das finanças, dos preconceitos sociais mais ou menos encalacrados e do apagamento da voz que vem do mundo rural e apresentam elementos de políticas integradoras, capazes de alcançar uma visão mais antropológica (por isso integradora) da pessoa e de sua comunidade. Do mesmo modo, visões críticas e propositivas encaram temas fundantes da vida urbana: a saúde dos adolescentes, tratada por Roberto Cacuro, da USP, Barbara Schwair e Gustavo Sarraf, da Université Paris V, um novo rosto participativo para a cidade de Artur Nogueira, SP, trabalho de Luiz Carlos Gonçalves, e a escola como lugar de construção da esfera pública, texto de Eduardo Girotto. A leitura desse material científico pode, no mínimo, subsidiar seminários, colóquios e encontros de agentes públicos das nossas cidades. O cruzamento da reflexão crítica com a memória da experiência pode engendrar, no local da ação, planos de trabalho, políticas originais e inovadoras.

Há mais. Os processos de comunicação, de informação e a formação de redes sociais são encarados por Roberto Gondo Macedo, Adilson Almeida, Conceição Aparecida Sanches, Dalmo de Oliveira Sousa e Silva, Cloves Costa, Anderson Rafael, Nascimento e Juliana Serzedello Lopes. Exceção feita a Conceição, da Universidade Capital, os pesquisadores da Metodista analisam, discutem e sugerem proposições no sentido de aumentar a visibilidade dos moradores-cidadãos, ampliar as articulações sociais e garantir a importância das tecnologias a serviço do bem-comum.

Empreendedorismo, política de gênero e o “mundo” do centro urbano completam o espectro dos estudos, todos apresentados no Seminário Internacional de Políticas Públicas, realizado em maio de 2008 na Metodista. Os pesquisadores Marcos Aurélio Bernardes e Anderson Rafael Nascimento estudam a constituição de outro espaço público pelo advento das incubadoras de micro e pequenas empresas; Dagmar Pinto de Castro e Anderson Rafael Nascimento tratam de gênero e participação no interior da economia solidária. Não seria possível pensar em cultura solidária sem vencer as mediações alinhadas às estruturas dominantes, que ainda humilham e subordinam as mulheres. Enfim, para começar, Leonardo Mesentier mostra a relevância crescente que “a economia da cultura e do lazer vem ganhando no mundo da produção…”

Abertos os textos, sugere-se vivamente sua leitura, posta à luz pela Editora Metodista. Além dos demais valores apontados, viceja dentro deles um sentido de militância na área da res publica. Certamente essa militância não cega o espírito científico. Ao contrário, soma-se a ele para constituir uma nova racionalidade política, a qual, ao negar promessas e clientelismos, bem como o modo pé-quebrado das gestões tradicionais nos municípios, exige o direito à cidade para todos, hic et nunc.

Dados Técnicos
Peso: 460g
ISBN: 9788578140809