Literatura

Sob o nome tonitruante de Stálin

10 julho, 2014 | Por Isabela Gaglianone

O russo Óssip E. Mandelstam (1891-1938) é um dos maiores escritores do período soviético e do século XX. No Brasil, de sua autoria, há apenas o volume que reúne O rumor do tempo e Viagem à Armênia (respectivamente, de 1925 e 1932-33), publicado pela Editora 34 e traduzido por Paulo Bezerra. Ambas narrativas, de caráter memorialístico e reflexivo, representam com amplitude intelectual o cruzamento de culturas, vozes e estilos que povoam o universo deste tão singular autor.

Óssip E. Mandelstam faleceu tragicamente em uma prisão na Sibéria durante a era de terror stalinista. Após escrever um poema anti-stalinista, “Epigrama de Stalin” – em que o ditador aparece com enormes bigodões de barata –, foi preso, em 1934. Morreu por inanição. 

Boris Schnaiderman, no livro Os Escombros e o mito, refere-se ao poeta comentando que ele sofria de crises nervosas e que foi preso apesar de não desenvolver nenhuma atividade política, foi retirado de sua casa em 1934. Durante a era soviética, Óssip E. Mandelstam foi editado muito parcialmente, apenas a partir da década de 60 seus textos começam a circular livremente. Muito atento às variações sonoras das palavras, o poeta depois dizia em voz alta seus poemas – “Sou o único na Rússia a compor de viva voz”, diz um de seus versos –, ditando-os à sua mulher, que os transcrevia em cadernos escolares. Após sua morte brutal, seus versos foram mantidos para a posteridade por ela, que os decorou e os repassou aos amigos que os divulgaram no estrangeiro.

Sobre os textos reunidos neste volume, a professora Jerusa Pires Ferreira – autora do interessante livro Armadilhas da Memória e Outros Ensaios –, em artigo, comenta: “Sua confissão corajosa em várias passagens e no belo livro de Memórias (ou de anti-memórias) que é Rumor do Tempo não significaria uma rejeição à sua “identidade forte” mas, a meu ver, constatação de como lhe era difícil compatibilizar vida e história. O discurso poético apreende aí muito mais do que se poderia fazer de outro modo, e nos oferece sobre a noção de identidade cultural, páginas extraordinárias, que trazem do pessoal ao social, em ondas contínuas. Cabe muito bem a intensidade da noção de crise, na busca de compatibilização das várias correntes identitárias”; em Viagem à Armênia, a professora aponta que Óssip Mandelstam discute “o que considera o conteúdo vital dos armênios e sua prática de guiar-se pelos relógios de sol, como o das ruínas de Zvardnódze, em forma de roda astronômica ou rosa gravada em pedra. E começa a detectar nesse povo, desde aquilo que julga ser a ausência de metafísica até a vocação filológica, imergindo em considerações sobre a língua armênia, suas formas de pronunciar, suas etimologias. Assim é a Armênia, ele nos diz, e vai apontando. A cor o prende, o olhar se reativa como função principal, e é então que aproveita para discutir tudo o que vê. Mas é preciso não esquecer que esta viagem que é, todo o tempo, distensão e descoberta e que nos é oferecida em imagens fotográficas de então estava carregada de episódios dramáticos”.

A Editora 34 disponibiliza uma visualização,

 

 

O RUMOR DO TEMPO E VIAGEM À ARMÊNIA

Autor: Óssip E. Mandelstam
Editora: Editora 34
Preço: R$ 38,00 (160 págs.)

 

 

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