Literatura

Realidade ou ficção?

21 julho, 2014 | Por Isabela Gaglianone

“Margaridas”, Odilon Redon

Lançamento da Companhia das Letras, Flores artificias, de Luiz Ruffato, conta uma história que se passa com o próprio escritor, que  recebe em sua casa a correspondência de um desconhecido. Trata-se de um manuscrito, que reúne memórias de um engenheiro, funcionário graduado do Banco Mundial, Dório Finetto, escritas ao longo das suas inúmeras viagens a trabalho, como consultor de projetos na área de infraestrutura. Suas narrativas, contudo, apesar de despretensiosas literariamente, mostram um observador arguto e sensível e uma personagem capaz de se misturar com naturalidade num grupo de desconhecidos. A partir dessas observações, Finetto compôs o livro que manda à casa do escritor Ruffato Viagens à terra alheia, com histórias narradas que não foram vividas pelo próprio Finetto, e sim por pessoas que ele teria conhecido em viagens ao redor do mundo. Este livro dentro do livro Ruffato transforma no romance Flores artificiais. Partindo de um esqueleto ficcional, Ruffato, enquanto autor, não enquanto personagem do próprio livro, brinca com as fronteiras entre ficção e realidade. O livro é marcado pela força literária que é particularidade de sua obra.

Em entrevista ao jornal Zero Hora, Ruffato disse: “Meu grande desafio em cada livro é encontrar a forma exatamente adequada para discutir o tema que quero discutir. O personagem Dório Finetto é um desenraizado, por isso o livro também é desenraizado, não se escora em uma forma tradicional de narrar”.

Segundo Giovanna Dealtry, professora da PUC-Rio e organizadora do livro O futuro pelo retrovisor, em artigo publicado no jornal O Globo: “Em uma época em que proliferam vozes a falar somente de si, Luiz Ruffato apresenta um romance sobre a escuta. […] Se os elementos “documentais” do livro — a apresentação, o memorial, a carta de Dório destinada a Ruffato, as notas de pé de página etc. — caminham na direção de assegurar ao leitor a veracidade do que ali será narrado, eles são igualmente negados dentro da própria estrutura do romance. O autor de “Eles eram muitos cavalos” sabe perfeitamente da impossibilidade da transmissão do “real” na contemporaneidade, e isso fica claro desde o início da narrativa, quando o ensaio “Advertências sobre os escrúpulos da fantasia”, de Luigi Pirandello, é evocado: a vida pode ser inverossímil, a arte não. A própria transformação do título, na clave da ironia, de “Viagens na minha terra”, do português Almeida Garret, revela a impossibilidade de conhecimento do “outro”. “Minha terra” tornada em “terra alheia” torna-se desconhecida, separada de um “eu”, assim como o sujeito, torna-se incapaz de ser decifrado em sua totalidade. […] Diante dessa pluralidade de vozes emaranhadas no próprio questionamento do lugar do autor, resta ao leitor crer não em Dório ou no autor, mas no buquê de flores artificiais entregue a nós. A realidade possível é o artifício e só a narrativa pode e deve ser verossímil”.

O mineiro Luiz Ruffato já publicou vários livros, entre os quais a pentalogia Inferno provisório e o aclamado Eles eram muitos cavalos, pelo qual recebeu os prêmios APCA e Machado de Assis, da Biblioteca Nacional.

A Companhia das Letras disponibiliza um trecho de Flores artificias para visualização:

 

FLORES ARTIFICIAIS

Autor: Luiz Ruffato
Editora: Companhia das Letras
Preço: R$ 34,00 (152 págs.)

 

 

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